Antes que Anochezca - Opinião
agosto 13, 2009Antes que Anochezca é uma autobiografia do escritor Reinaldo Arenas que nasceu e viveu, a maior parte da sua vida, em Cuba e morreu em Nova Iorque já em 1990.
E o livro começa, curiosamente, pelo fim. Ou seja, temos a voz de Reinaldo no tempo presente em que se encontrava, já doente e bastante debilitado devido à Sida e a outras doenças de que padecia e em que nos conta precisamente essa vivência, dos seus últimos dias como escritor ainda lúcido o suficiente para escrever as suas memórias.
E o que vos posso dizer sobre este livro, primeiramente, é que é um testemunho verdadeiramente brutal. Percorremos toda a sua vida desde a infância até à sua morte, uma vida preenchidíssima e marcada pelas piores razões.
Sendo assim, comecemos pelo início. Reinaldo Arenas nasceu em Holguín, em Cuba e passou a sua infância com a sua mãe, os seus avós e as suas inúmeras tias que eram ou divorciadas ou solteiras. Uma infância vivida no meio de dificuldades (como foi toda a sua vida), num ambiente rural, mas em que ele se descobriu a si próprio e cujo tempo era de inocência e, por isso, de felicidade. Foi neste ambiente também que ele descobriu a sua homossexualidade. E isto tem muito que se lhe diga, é uma parte inolvidável da sua vida e um dos motivos pelos quais bastantes problemas resultaram para ele, na sociedade machista criada pela revolução levada a cabo por Fidel Castro.
Mais tarde, durante a sua adolescência, somos levados ao início da revolução castrista, à qual Reinaldo aderiu nos primeiros tempos de euforia, mas que depois rejeitou e, inclusivé, lutou contra. Foi nesta altura que Reinaldo começou a escrever.
Temos, então, o mote para que Reinaldo fosse considerado, para Castro, alguém perigoso para o sistema e, por isso, a eliminar ou "converter": era homossexual, dissidente e escritor. Creio que nenhuma das suas obras esteja publicada em Cuba mas, com a ajuda de alguns amigos que se lhe mantiveram fiéis, conseguiu que a maior parte das suas obras fossem publicadas no estrangeiro mesmo sendo perseguido e alvo de censura no seu país. Destacam-se Celestino antes de alba, El palácio de las blanquíssimas mofetas e Otra vez el mar. Contudo, a dada altura a perseguição e a vigilância tornam-se tais, alguns dos seus supostos amigos se revelam informantes do regime, que Reinaldo é obrigado a viver clandestinamente no seu país, sempre fugindo de um lado para o outro, a maior parte das vezes passando fome, com medo de ser descoberto mas, ainda assim, com algum tempo para as suas aventuras eróticas, para ler a Ilíada que o acompanhava e para escrever uma carta à ONU, Cruz Vermelha Internacional e à UNESCO, denunciando a perseguição de que era vítima e apelando a que o tirassem de lá.
Finalmente Reinaldo é preso e a sua estadia na prisão provou ser um verdadeiro inferno. Alvo de tortura, de uma prisão injusta e de um regime que só lhe dava duas hipóteses: morrer ali ou converter-se aos ideais de um regime sufocante e comunista. Esta repressão é-nos contada, também, através do seu conhecimento de vários seus outros amigos e escritores que passaram pelo mesmo e, através disso, pude constatar uma coisa: alguns convertiam-se a Fidel e caíam em desgraça, suicidando-se mais tarde; outros recusavam-se a aceitá-lo e, mais tarde ou mais cedo, também morriam. Portanto, para todos aqueles que negam o regime a única saída daquela ilha era a morte. E a morte é um factor que está presente em todo o livro: os fuzilamentos incessantes no início da revolução, as mortes nas prisões, as mortes por suicídio, as mortes pela agonia da desgraça das suas vidas e, até, a morte no seu exílio.
Temos, então, um livro cuja escrita é crua, honesta, realista, directa ao assunto e, por vezes poética. Poética quando ele se refere à infância, lugar de eterna felicidade e liberdade, lugar de descoberta, de aprendizagem e da família. Poética quando ele fala da Lua, companheira de todas as horas e do mar. Até na hora da sua morte.
Um livro que fala da sua vida turbulenta, agitada, marcada pela repressão que teimava em asfixiar o mundo cultural cubano, mas também pela revolução sexual que se fez sentir na ilha nos anos 60. Que fala dos talentos perdidos, assassinados pela mão esmagadora do regime, das tertúlias literárias que se faziam em segredo e que, aos poucos, de dezenas de escritores no fim já só fazem parte três. Fala das várias tentativas de fuga da ilha, a que finalmente foi bem sucedida e dos seus anos posteriores, já no exílio nos Estados Unidos, passando por vários países que visitou, nomeadamente na Europa.
Adorei este livro. A sua escrita é simples mas marcante e é uma história de vida como há muitas que nós nem sonhamos. É um testemunho de coragem e persistência e de uma sensibilidade maior em relação à natureza, aos sonhos e à liberdade.
E o livro começa, curiosamente, pelo fim. Ou seja, temos a voz de Reinaldo no tempo presente em que se encontrava, já doente e bastante debilitado devido à Sida e a outras doenças de que padecia e em que nos conta precisamente essa vivência, dos seus últimos dias como escritor ainda lúcido o suficiente para escrever as suas memórias.
E o que vos posso dizer sobre este livro, primeiramente, é que é um testemunho verdadeiramente brutal. Percorremos toda a sua vida desde a infância até à sua morte, uma vida preenchidíssima e marcada pelas piores razões.
Sendo assim, comecemos pelo início. Reinaldo Arenas nasceu em Holguín, em Cuba e passou a sua infância com a sua mãe, os seus avós e as suas inúmeras tias que eram ou divorciadas ou solteiras. Uma infância vivida no meio de dificuldades (como foi toda a sua vida), num ambiente rural, mas em que ele se descobriu a si próprio e cujo tempo era de inocência e, por isso, de felicidade. Foi neste ambiente também que ele descobriu a sua homossexualidade. E isto tem muito que se lhe diga, é uma parte inolvidável da sua vida e um dos motivos pelos quais bastantes problemas resultaram para ele, na sociedade machista criada pela revolução levada a cabo por Fidel Castro.
Mais tarde, durante a sua adolescência, somos levados ao início da revolução castrista, à qual Reinaldo aderiu nos primeiros tempos de euforia, mas que depois rejeitou e, inclusivé, lutou contra. Foi nesta altura que Reinaldo começou a escrever.
Temos, então, o mote para que Reinaldo fosse considerado, para Castro, alguém perigoso para o sistema e, por isso, a eliminar ou "converter": era homossexual, dissidente e escritor. Creio que nenhuma das suas obras esteja publicada em Cuba mas, com a ajuda de alguns amigos que se lhe mantiveram fiéis, conseguiu que a maior parte das suas obras fossem publicadas no estrangeiro mesmo sendo perseguido e alvo de censura no seu país. Destacam-se Celestino antes de alba, El palácio de las blanquíssimas mofetas e Otra vez el mar. Contudo, a dada altura a perseguição e a vigilância tornam-se tais, alguns dos seus supostos amigos se revelam informantes do regime, que Reinaldo é obrigado a viver clandestinamente no seu país, sempre fugindo de um lado para o outro, a maior parte das vezes passando fome, com medo de ser descoberto mas, ainda assim, com algum tempo para as suas aventuras eróticas, para ler a Ilíada que o acompanhava e para escrever uma carta à ONU, Cruz Vermelha Internacional e à UNESCO, denunciando a perseguição de que era vítima e apelando a que o tirassem de lá.
Finalmente Reinaldo é preso e a sua estadia na prisão provou ser um verdadeiro inferno. Alvo de tortura, de uma prisão injusta e de um regime que só lhe dava duas hipóteses: morrer ali ou converter-se aos ideais de um regime sufocante e comunista. Esta repressão é-nos contada, também, através do seu conhecimento de vários seus outros amigos e escritores que passaram pelo mesmo e, através disso, pude constatar uma coisa: alguns convertiam-se a Fidel e caíam em desgraça, suicidando-se mais tarde; outros recusavam-se a aceitá-lo e, mais tarde ou mais cedo, também morriam. Portanto, para todos aqueles que negam o regime a única saída daquela ilha era a morte. E a morte é um factor que está presente em todo o livro: os fuzilamentos incessantes no início da revolução, as mortes nas prisões, as mortes por suicídio, as mortes pela agonia da desgraça das suas vidas e, até, a morte no seu exílio.
Temos, então, um livro cuja escrita é crua, honesta, realista, directa ao assunto e, por vezes poética. Poética quando ele se refere à infância, lugar de eterna felicidade e liberdade, lugar de descoberta, de aprendizagem e da família. Poética quando ele fala da Lua, companheira de todas as horas e do mar. Até na hora da sua morte.
Um livro que fala da sua vida turbulenta, agitada, marcada pela repressão que teimava em asfixiar o mundo cultural cubano, mas também pela revolução sexual que se fez sentir na ilha nos anos 60. Que fala dos talentos perdidos, assassinados pela mão esmagadora do regime, das tertúlias literárias que se faziam em segredo e que, aos poucos, de dezenas de escritores no fim já só fazem parte três. Fala das várias tentativas de fuga da ilha, a que finalmente foi bem sucedida e dos seus anos posteriores, já no exílio nos Estados Unidos, passando por vários países que visitou, nomeadamente na Europa.
Adorei este livro. A sua escrita é simples mas marcante e é uma história de vida como há muitas que nós nem sonhamos. É um testemunho de coragem e persistência e de uma sensibilidade maior em relação à natureza, aos sonhos e à liberdade.
0 comentários