Mors-Amor - Opinião

março 16, 2021



Este livro fazia parte das minhas leituras mais esperadas para este ano. Fiquei a conhecer este livro, a autora e as suas motivações para escrever esta história a partir de uma entrevista com a Nights e a Shadow Frozen, no âmbito do projecto Adagio in Libri. A Sónia contou de forma tão apaixonada e cativante a história por detrás do surgimento deste livro, que me fez logo ter vontade de o ler. E assim o fiz: comprei o livro directamente no site da autora e resolvi lê-lo este ano, também numa leitura conjunta organizada pelas meninas ali acima mencionadas. Terminada a leitura, venho aqui falar-vos um pouco da minha experiência.

A história de Mors Amor segue duas linhas cronológicas diferentes: a primeira, que é o grande foco do livro, passa-se em meados do século II a.C. na Lusitânia e segue uma das tribos lusitanas que luta contra a conquista pelo Império Romano; a segunda, transporta-nos para finais do século XIX, em Torredeita, no distrito de Viseu, para um momento muito peculiar onde coisas estranhas, quase sobrenaturais, começam a acontecer. Num misto de ficção histórica com elementos de fantasia e de sobrenatural, a autora vai-nos revelando estas histórias tão cativantes sobre um passado português que, infelizmente, se sabe tão pouco. E quando se sabe, as fontes são sempre externas, da perspectiva do povo conquistador, neste caso Roma, uma vez que os lusitanos não deixaram registos escritos que nos permitam ter conhecimento em primeira-mão sobre eles. Dos registos romanos, sabemos que os lusitanos eram um povo ibérico corajoso, hábil em tácticas de guerrilha, com uma forte hierarquia guerreira e foi o que durante mais tempo fez frente ao domínio de Roma. Em termos religiosos, tinham uma mitologia com deuses e rituais próprios, com crenças muito semelhantes ao que hoje sabemos da mitologia e cultura celta das Ilhas Britânicas. Algumas das figuras históricas lusitanas mais conhecidas figuram neste livro, como Púnico, o grande unificador e líder das vários tribos lusitanas contra a invasão romana, mas também Cesaro, Caucenos, Táutalo e Viriato que, aqui, é ainda uma criança.

O que Sónia nos traz é, então, uma história ficcionada sobre este período histórico e sobre estas tribos lusitanas que tanta luta deram a Roma. Podemos conhecer alguns dos seus deuses, do seu modo de vida, das suas crenças e rituais, das suas tácticas militares, numa narrativa riquíssima em detalhe e pesquisa histórica que não é despejada ao leitor, mas faz, sim, parte de todo o contexto do enredo propriamente dito. Dentro deste contexto histórico, temos a história ficcional de várias personagens que lutam para sobreviver e manter viva o seu modo de vida e a sua cultura. Gostei bastante do enredo, da escrita e da forma como a narrativa está estruturada. Gostei bastante de encontrar um livro cujo contexto histórico é o dos povos lusitanos, algo que não é, de todo, explorado por literatura nenhuma. Editoras portuguesas: vocês peguem neste livro porque tem muito potencial, qualidade e público garantido, de certeza! Gostei das personagens principais, mas não consegui criar laços com nenhuma delas, talvez porque o foco é mostrar de que forma elas têm influência no decurso da acção e dos vários acontecimentos, e não tanto a dimensão psicológica das mesmas. Alguns momentos também me pareceram um pouco apressados, mais para o fim do livro, mas também pode ser algo que foi mencionado ao de leve e que só iremos compreender melhor noutros livros.

Quero também dizer que, uma vez que este livro foi auto-publicado, iria beneficiar de uma boa revisão no que diz respeito à pontuação e a algumas gralhas que existem no livro, mas que não interrompem a fluidez do discurso narrativo nem confundem o leitor. O livro acaba "não acabando", porque a autora nos deixa pendurados, à espera do que virá nos próximos volumes, que nos ajudem a unir as pontas soltas que aqui ficaram e que, tenho a certeza, farão sentido nos próximos livros. No fim, a autora deixa uma lista de todas as personagens intervenientes, inclusive com uma breve descrição histórica das personagens que, de facto, existiram.

Gostei do livro, do ambiente histórico, do enredo que Sónia criou, e de saber que há alguém interessado no nosso passado histórico que remonta a estes homens e mulheres tão valorosos. Já mereciam livros assim! Aconselho todos a irem ver a entrevista da Sónia e a perceber melhor o que está por detrás deste livro. É impossível ficar indiferente!

4/6 - Bom

(Esta leitura conta para o desafio Mount TBR Reading Challenge 2021)

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Detalhes

Páginas: 326
Sinopse:
"Os historiadores, os poetas e os bardos têm por hábito contar os feitos dos vencedores. Grandes conflitos ganhos por generais e seus exércitos, aventuras em que a supremacia de uns, se sobrepõe à derrota de outros.

A história da Lusitânia é escassa, pois os únicos relatos que chegaram até nós, chegaram justamente por quem a conquistou. Mas que extraordinários devem ter sido estes homens da montanha! Suscitaram pelos próprios conquistadores, a necessidade de mencionarem os que tombaram nos seus anais de forma tão solene e reverente.

Esta não é uma história de guerra ou de batalhas. Não exulta as façanhas deste ou doutro estratega militar. É tão só e apenas um testemunho das vidas destes homens e mulheres, Lusitanos, que durante 200 anos tentaram manter as suas tradições e a sua cultura contra o maior império do mundo: Roma."

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