The Blade Itself - Opinião
junho 15, 2021Podem ouvir a minha opinião no podcast, AQUI.
The Blade Itself é o primeiro livro da trilogia The First Law, de Joe Abercrombie, e é também o primeiro livro que leio deste autor. Tinha bastantes expectativas, uma vez que li muitas críticas positivas em relação aos livros dele e há bastante tempo que queria ler algo deste autor. Por isso, aproveitei o Mangalipa Mania para o começar e só agora o terminei. Porquê? Porque após a loucura do Mangalipa Mania fiquei com vontade zero de pegar num livro e lê-lo de enfiada! Se bem que, sempre que pegava em The Blade Itself, ficava sem vontade de o largar.
Esta é uma obra de Fantasia cujo foco é, maioritariamente, as personagens. Este livro não avança tanto pela acção, não há momentos de batalha, de conflitos, mortes, guerras, aventuras, mas sim pelo desenvolvimento das personagens. Nesse sentido, seguimos três personagens principais: Logen Ninefingers, um homem com um passado obscuro e violento, guerreiro oriundo do Norte; Jezal dan Luthar, um jovem soldado, nobre, capitão da Guarda Real; e Sand Glokta, um antigo herói de guerra que, após ter sido capturado e torturado durante anos pelos Gurkish, volta deformado, é marginalizado e passa a fazer parte da Inquisição. Há várias personagens secundárias relevantes que vão acompanhar as personagens principais, mas de facto a acção e o desenvolvimento da narrativa anda sempre à volta destes protagonistas.
Do que trata este livro? No fundo, não há um enredo, não há um centro para o qual todos caminham, não há um mistério a ser resolvido nem um mal comum contra qual vão lutar. Este livro é uma descoberta destas personagens, mas também do mundo em que habitam, das suas características geográficas, sociais, históricas, talvez para familiarizar o leitor das dinâmicas existentes naquele mundo de forma a que, posteriormente, a acção se possa desenrolar nos próximos volumes. De facto, o livro tem muito mais acção nas últimas 50 páginas do que no livro inteiro e isso deixa adivinhar uma história com mais aventuras e peripécias no volume seguinte.
Mas o que me espantou mais, terminada esta leitura, foi perceber que, apesar de não se passar grande coisa no livro, adorei-o. Basicamente, nós temos estas três personagens principais inseridas neste mundo, e nós simplesmente seguimo-las no decurso das suas vidas. E nenhuma das personagens tem grandes objectivos de vida. Ou seja, não há ninguém à procura de vingança, ou a lutar por um ideal, ou por um lugar no trono, ou contra um grande vilão. São simplesmente personagens metidos nas suas vidas e é nas suas vivências mundanas do dia-a-dia que as vamos conhecendo melhor.
Nesse sentido, as personagens possuem uma enorme profundidade emocional e psicológica e são o ponto forte deste livro. Estão muito bem construídas e desenvolvidas, são muito reais para nós que as vamos acompanhando e quase sentimos que estamos lá com elas a viver o mesmo que elas. Gostei muito que todas são moralmente questionáveis, no sentido em que não há personagens completamente boas nem completamente más, que só fazem as coisas acertadas ou que só fazem as coisas erradas. Estas personagens são incrivelmente humanas, com as suas motivações, as suas dúvidas, os seus próprios questionamentos e isso confere uma dose maior de realismo.
Destas personagens, a que mais me interessou foi Glokta. E não sei eu, de certeza, a missa a metade, porque ainda me faltam ler dois livros e muita coisa acontecerá. Glokta é um homem que vive permanentemente com dores, devido às suas deformidades, depende de várias pessoas para se poder movimentar, faltam-lhe metade dos dentes, o que faz com que ele não se consiga alimentar apropriadamente, e faz parte da Inquisição, dedicando a sua vida a torturar pessoas para obter informações. Eu sei, não é propriamente a personagem mais charmosa. Mas há algo nele, na sua inteligência, perspicácia e sagacidade que me interessa. Para mim, Glokta é a personagem mais complexa do livro, até agora, e talvez seja isso que me atrai, porque consegue-se perceber que há várias camadas que compõem esta personagem, e é isso que a torna a mais interessante, para mim.
Outro ponto positivo deste livro, é o humor. Não há propriamente grandes cenas engraçadas, ou momentos hilariantes no livro. Mas são as falas, os pensamentos, as interacções que as personagens têm umas com as outras dotadas de algum sarcasmo e ironia que acaba por revelar momentos subtis de humor que conferem um tom mais leve em determinados momentos narrativos e que nos fazem rir por dentro.
Com este livro, consegui perceber que Abercrombie escreve personagens como ninguém. Todas são complexas e com potencial evolutivo. Ou seja, não são estáticas, não creio que vão permanecer assim a trilogia toda. De certeza que se vão modificando à medida que vão experienciando várias coisas, e é assim que todos somos. Claro que temos uma base, mas vamos crescendo, amadurecendo e alterando os nossos pontos de vista consoante as experiências que vamos tendo nas nossas vidas. Somos permanentemente moldados e é assim que estas personagens são também. Quero muito continuar a ler esta trilogia e a seguir estas personagens.
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